Liberdade instantânea

Para quem foi ao último Encontro Nordestino, e participou do feedback deve se lembrar de uma situação muito engraçada. Alguém estava falando que se sentia um pouco incomodado com o fato de xingarmos muito. Eis nesse momento o Vovô dita um dos momentos mais engraçados do ENPK: um “Você é viado, é?” bem retrucado. Ainda rio sempre que lembro dessa situação.

Mas enfim, o que quero discutir não é a situação, mas uma realidade que ela mostra: a liberdade quase instantânea que um tracer ganha com outro. Não sei se isso é uma regra universal, ou coisa de nordestino mesmo, mas bem como a mania de termos praticantes que trabalham com sistemas (programação, design, etc.), existe a mania de tornar o companheiro de treino em um amigo íntimo. Talvez nem tanto como um amigo íntimo, mas alguém com os direitos do mesmo.

Digamos que no meu segundo treino, se me lembro bem, já estava dormindo na casa de alguém. Então, não é qualquer novo amigo seu que você confia leva para casa, não é? Pois bem, no parkour ele nem precisar ser amigo para ter essa e outras regalias, basta treinar com você, ou com um amigo, ou amigo de amigo. Ok, estou exagerando um pouco, existe também aquela história de “gostei dele de cara”. Outro exemplo foi Blake, um gringo que esta rodando o mundo fazendo uma pesquisa sobre parkour. Bastou um praticante brasileiro ser uma ponte para que ele arrumasse casas de pelo Brasil para sua estadia.

Essa é uma situação diferente, porém não vai ser a parte chocante da coisa, afinal você não vai se sentir ofendido se alguém o convidar sem viadagem mode-on pra dormir na casa dele. Mas digamos que faça uma coisa gratificante e espere elogios. Os elogios não chegam! O que recebemos são palavras... bem, você vai constatar por conta própria. Não se assuste meu caro, isso é elogiar no nosso mundo. Brincadeiras brutas também marcam presença no nosso meio, mas tracer que é tracer leva na esportiva e contínua, no pior dos casos fica sem graça, e só. O  parkour nordestino realmente parece um pouco assustador de fora, mas acredite, aquela aparente bola de ódio e desprezo é na verdade uma linda família de rústicos praticantes de parkour.

Eu acho isso muito bom, nós não precisamos nos preocupar em sermos cultos ou procedentes uns com os outros. O parkour da sensação de liberdade física, fenomenal, mas a experiência não seria completa sem a galera e o clima que ela cria. Um ambiente onde não existem regras de etiqueta, mas sempre se faz constante o bom humor e a esportividade é sem explicações, é o tipo de coisa que só se aprende na prática. Não que eu esteja desvalorizando outros esportes, mas os amigos continuam amigos quando você perde aquele gol do baba da rua ou sempre leva seu time a derrota? Seus novos instantâneos amigos continuam mais amigos ainda quando você erra no parkour.

A aceitação de um novo tracer nos grupos de praticantes costuma ser um processo rápido, fácil e indolor. Se isso não acontecer é porque você está dificultando as coisas. Pessoas querendo sua amizade não vai faltar, agora é só não fugir delas. Então boa sorte pro seu primeiro treino, ou segundo, ou qualquer outro número ordinal, e cuida bem das amizades que ele vai lhe proporcionar.